Resenha A Mulher e A Casa Eneida Queiroz

Desde criança os grandes castelos me chamavam atenção, mais tarde me encantei pelo século XIX com a leitura de Orgulho e Preconceito de Jane Austen e desde então nutro um grande amor por romances históricos. Já li muitas obras, com algumas exceções, os livros históricos de escritores modernos, me pareciam superficiais, sem um embasamento. Portanto, após várias decepções encontrar A mulher e a Casa, da Eneida, foi uma memorável surpresa, tudo que eu poderia esperar de um livro histórico e mais, muito mais...

Vamos à estória, que é baseada no romance real entre uma senhora de escravos e um abolicionista.  Sim, leitores, vocês entenderam bem, é sobre um amor improvável, impossível e ainda no século XIX! Uma combinação excelente, mas que não seria a obra maravilhosa que é sem a costura impecável da autora, que soube preencher com ficção as lacunas encaixando os fatos verídicos e imaginados com perfeição numa narrativa fluida.

Em Vassouras, no interior do Rio de Janeiro, existe a Casa de Hera, um casarão preservado do século XIX, cuja dona era Eufrásia Teixeira Leite.

É sobre ela, uma senhorita singular de traços fortes que o livro trata. Tudo se inicia quando Desirée, uma jovem graduada em história começa a trabalhar no museu de Hera, impressionada pela antiga proprietária do casarão, ela começa a descobrir sobre sua vida, sobretudo seu relacionamento com Joaquim Nabuco.

Até que em uma noite, Desirée vê a figura de Eufrásia, que conta um grande segredo, escondeu as cartas que nunca foram enviadas no túnel do amor, no quintal do casarão. Desirée encontra as cartas e começa a reconstruir a vida da dona do casarão, e nós leitores, somos transportados há mais de um século atrás ao Rio de Janeiro.

A estória de amor do casal é cheio de ida e vindas. Uma paixão arrebatadora, mas impossível, Nabuco é um abolicionista convicto, e ela uma dona de escravos, que os considera sua propriedade. Apesar das divergências, durante um cruzeiro, eles ficam noivos. No entanto, logo rompem, e passam anos trocando cartas, sem chegar a nenhuma conclusão definitiva. É fato, que Nabuco queria muito se casar com Eufrásia, que não consegue dizer o tão esperado sim. Ela vai morar na Europa, Nabuco se torna político no Brasil. Destaco as palavras reais de Eufrásia transcritas no livro de suas cartas, e as respostas fictícias de Nabuco, que são muito coerentes. Porque as cartas que Nabuco enviou foram perdidas, mas a lacuna foi muito bem preenchida.

“Meu bom amigo (...) Estou num estado de alma o mais aflitivo possível, não posso agora discernir sobre bem os meus sentimentos. Eu lhe escreverei aos Estados Unidos. Prometo não afligi-lo mais, esperava poder cumprir minha promessa, se soubesse o que me custa escrever-lhe, escrever-lhe esta carta (...)” Trecho de uma carta de Eufrásia para Joaquim.

Quanto as cartas secretas que Desirée encontrou, as que não foram enviadas por Eufrásia. São o desfecho final, e uma grata surpresa, porém triste, confesso que me emocionei. Uma linda estória de amor que ficará guardada no meu coração. Vou encerrar pelo começo, abaixo um trecho do primeiro encontro:

“E foi essa mocinha à beira d’ água – branca como quem quase não sai de casa, ornada por vestes de seda listrada, claramente apertada por um espartilho de barbatanas, com fitas azuis a voarem para trás da cintura – que chamou atenção de um rapaz que já se acreditava um homem. Era Joaquim Nabuco, acompanhado de sua irmã caçula sinhazinha.”